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Tirando o pé do chão batido

Publicado: Sexta, 12 de Agosto de 2016, 17h27 | Última atualização em Terça, 16 de Agosto de 2016, 17h53 | Acessos: 4039

Laboratório transforma copinhos em pisos para residências

Desenvolvido no Laboratório de Ecocompósitos, o ecopiso foi patenteado pela UFPA.
imagem sem descrição.

 

Por Walter Pinto Fotos Alexandre Moraes

O Laboratório de Ecocompósitos da Faculdade de Engenharia Mecânica, ITEC/UFPA, é exemplo de laboratório que cumpre, com êxito, a articulação entre ensino, pesquisa e extensão. Seus projetos são desenvolvidos dentro de uma perspectiva da inovação, amplitude social e preocupação ecológica.

Desde 2001, o laboratório atua na área de materiais e processos de fabricação. Faz parte da sua natureza investigar novos materiais e estabelecer processos de fusão, com vista a transformar plásticos, vidros e latas descartáveis em novos objetos. No laboratório, o conhecimento científico transforma esses rejeitos em objetos úteis, como lajotas, cadeiras e barcos.

A matéria-prima do laboratório é, por excelência, o resíduo sólido descartado pelos catadores. Copos plásticos usados no cafezinho, serragem produzida pelas serrarias, casca do coco de babaçu, tampinhas de garrafa PET, enfim, aquilo que os catadores desprezam pela rentabilidade extremamente baixa interessa à equipe da professora Carmen Gilda Barroso Tavares Dias, coordenadora do Laboratório.

Recentemente, a UFPA passou a deter a patente de um tipo alternativo de piso, produzido com casca de babaçu e copo descartável de café. O ecopiso foi produzido no laboratório de Ecocompósitos e está em vias de ser produzido para uso de moradores de uma pequena vila de pescadores de Colares, município da região nordeste do Pará.

O produto é resultado da pesquisa de mestrado de Poliana Borges Bringel, no Programa de Pós-Graduação em Engenharia Química, interessada em produzir algo que pudesse beneficiar uma comunidade de abridoras de coco de babaçu, no Maranhão, sua terra natal. Seguindo orientação de Carmen Gilda, Poliana examinou o lixo da comunidade para ver o que poderia ser utilizado. Constatou que, além de casca de coco de babaçu, havia, também, uma expressiva quantidade de copinhos plásticos de café.

Copinhos e cascas foram levados ao laboratório. A análise revelou que a casca do coco de babaçu é um resíduo lignino-celulósico extremamente duro e o copinho plástico um polímero (PS), que, associado à casca, em condições específicas, pode resultar numa mistura muito consistente.

Nas comunidades, os dias de chão batido estão contatos

Na comunidade, muitas casas eram de chão batido, sujeitando seus moradores a diversas doenças. Pensando em melhorar a qualidade de vida dessas pessoas, os pesquisadores decidiram produzir, com base na fusão copinhos/casca, um piso para as casas. “A regra para que possamos fazer o piso é que ele resista à abrasão, além de possibilitar a higienização eficiente do espaço”, explica a pesquisadora Carmen Gilda.

No laboratório, foram determinadas as condições para se preparar as placas para o piso: percentagem de materiais, temperatura ideal de processamento e nível de dureza. Assim surgiu o ecopiso, marca registrada no Instituto Nacional de Propriedade Industrial. Pesquisas posteriores apontaram para uma alternativa à casca de babaçu. A mesma solidez foi possível alcançar com a substituição por serragem de madeira de lei, tipo sucupira e jatobá, por exemplo. A serragem é uma matéria facilmente encontrada em madeireiras e serrarias. 

Aparentemente, não há diferença entre o ecopiso e uma placa de cerâmica comercial: dimensões, cor e acabamento tornam difícil diferenciá-los a olho nu. Tal qual a lajota convencional, o ecopiso possui uma face enrugada para facilitar o assentamento à superfície e uma face lisa, que recebe cor e efeitos estéticos. Sua composição química, no entanto, faz a diferença, com incidência direta no barateamento das placas.

Em Colares, município da região nordeste do Pará, os pesquisadores da UFPA resolveram desenvolver o Projeto de Ecopiso numa pequena comunidade de pescadores, de condições habitacionais e de saneamento muito semelhantes às da comunidade piloto, no Maranhão. A ideia é envolver os comunitários em todas as etapas do processo, orientando-os nos procedimentos de fabricação dos pisos e, desta forma, colaborar com a melhoria efetiva da qualidade de vida deles. Os dias de chão batido estão contados na comunidade.

Em contato com a Associação dos Pescadores, a equipe do Projeto Ecopiso ouviu famílias locais expressando a vontade de contar com uma atividade que pudesse gerar algum tipo de renda na comunidade, haja vista a falta de ocupação, agravada pela baixa escolaridade de muitos moradores.

No mesmo período, o Banco da Amazônia lançou um edital de incentivo a projetos de sustentabilidade. “Pensamos, então, em levar alguns dos projetos realizados no nosso laboratório para execução na comunidade, com apoio do Basa”, conta Maria da Glória Cristino, professora aposentada de Química, da Escola de Aplicação da UFPA, voluntária do projeto.

O trabalho continua com ou sem financiamento

A equipe elaborou um projeto para a Associação de Pescadores, com o objetivo de revestir o chão das casas com ecopiso. O Basa garantiu a liberação de parte do valor orçado, mas um problema burocrático com a documentação da Associação impediu que o financiamento fosse efetivado.

O trabalho com a comunidade, no entanto, já se havia iniciado e, conforme garante Carmen Gilda, vai continuar, com ou sem financiamento. “Decidimos tocar o projeto considerando a necessidade da comunidade, o alcance social e sanitário e a simplicidade do processo que criamos”.

A primeira etapa do projeto envolveu a comunidade na coleta de matéria-prima. Os moradores conseguiram coletar muitos copinhos plásticos de café e realizaram a lavagem com água sanitária. Em seguida, ocorreu a cominuição dos copinhos (trituração). O projeto enviado ao Basa previa a aquisição de um triturador. Na ausência dele, a tarefa foi feita manualmente, sem nenhuma dificuldade. Em seguida, o material foi acondicionado em sacas.

Os moradores também coletaram serragem de uma serraria próxima à comunidade, mas ela procedia de diferentes tipos de madeira e nem todas com a resistência exigida para o processo de produção do ecopiso. Os moradores foram orientados a coletar serragens apenas de madeiras de lei.

“A nossa proposta é envolver a comunidade no beneficiamento das matérias utilizadas no processo. Nossa participação é transformar aquilo que está agredindo o meio ambiente em um objeto de utilidade e de alcance social”, diz a coordenadora do laboratório, Carmen Gilda.

Na próxima visita, os pesquisadores irão repassar informações sobre a pressão e a temperatura necessárias para a produção dos pisos. “Para dar acabamento às placas, precisamos de uma prensa hidráulica e uma fonte de calor. Sem o financiamento, usaremos a prensa do nosso laboratório”, informa a coordenadora.

“Quando a gente desenvolve um processo e detém uma patente, podemos levar os resultados das pesquisas para comunidades carentes por meio de projetos de extensão. A Universidade está, assim, contribuindo para melhorar a qualidade de vida daquelas pessoas”, avalia Carmen Gilda.

Nessa linha, o laboratório estuda a possibilidade de fabricar barcos com materiais descartados. Caberá às comunidades coletar os rejeitos para a transformação em matéria-prima. Outro projeto está voltado para a produção de cadeiras infantis processadas com tampas de garrafas PET.

Além da coordenadora, compõem a equipe do projeto:  Maria da Glória Cristino, Maria Lúcia Ohana, Haroldo dos Santos Mota e alunos de pós-graduação do Laboratório de Ecocompósitos.

Ed.132 - Agosto e Setembro de 2016

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