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Entrevista: Novos cenários e velhas práticas

Escrito por Beira do Rio | Publicado: Sexta, 11 de Agosto de 2017, 16h28 | Última atualização em Sexta, 11 de Agosto de 2017, 18h21 | Acessos: 4160

Edir Veiga fala sobre ferramentas e manipulação nas pesquisas de opinião

Por Walter Pinto Foto Alexandre de Moraes

Há 13 anos, o cientista político Edir Veiga avalia as tendências eleitorais dos paraenses por meio do Instituto iVeiga. A expertise acumulada ao longo dos anos  coloca-o como privilegiado observador da cena política regional.  Na entrevista que se segue, ele fala das metodologias de pesquisa, explica por que as margens de erro devem ser de no máximo 2%, critica a proposta que quer impedir a divulgação de consultas às vésperas de eleição, analisa a grave crise política nacional e, como professor com mais de trinta anos de atuação na UFPA, traça um perfil da Instituição que vem ajudando a consolidar.

Por que as pesquisas falham ?

Todas as pesquisas possuem margem de confiança de 95%. Portanto errar faz parte dos riscos para quem atua no mercado das pesquisas eleitorais. Creio que o Tribunal Superior Eleitoral deveria obrigar os institutos a trabalharem obrigatoriamente em anos eleitorais com margem de erro de máximo 2%. Quando se trabalha com margem de erro de 3,4 ou 5%, está criado o contexto estatístico para a livre manipulação dos dados eleitorais. Quando o continuum varia para mais ou para menos no intervalo de 3 a 5%, nenhum instituto errará nenhuma pesquisa, mesmo que manipule os dados em até 10%.

Pesquisas, partidos e imprensa

No Pará, temos o duopólio nas comunicações entre os grupos ORM e RBA. Esses dois grupos disputam as verbas de publicidade dos governos municipal, estadual e federal. O grupo RBA tem ligações com o PMDB, e o Grupo ORM apoia qualquer candidato que seja contra o PMDB. Portanto os dois grupos não buscam isenção ao trabalhar com pesquisas. Eles não têm comportamento republicano quando se refere à publicação de pesquisas eleitorais e à interpretação dos resultados. No Brasil, creio que existem grupos de comunicação isentos na divulgação e interpretações dos resultados das pesquisas. No Sul e Sudeste, já existem ilhas de república em temas relacionados às pesquisas eleitorais e suas interpretações. No Pará, infelizmente, ainda não atingimos esse mesmo patamar. Por outro lado, a divulgação de pesquisas de opinião realizadas por institutos para partidos políticos desmoraliza os institutos que assim procedem perante a sociedade. Os partidos podem fazer suas pesquisas para consumo interno. Mas seria absurdo um partido publicar pesquisas eleitorais, afinal, nenhum partido publicaria uma pesquisa que lhe fosse desfavorável.

Pesquisas em véspera de eleição

Penso que proibir a divulgação dos resultados de pesquisas às vésperas de eleição, como está propondo o Congresso, é um desserviço à sociedade.  O eleitor precisa saber das tendências eleitorais da sociedade. Nos últimos dias que antecedem as eleições, todos os institutos querem acertar a pesquisa como instrumento de sobrevivência no mercado. Caso ocorram manipulações, estas provavelmente ocorrem em meses que antecedem as eleições.

Redes sociais como ferramenta de pesquisa

Uma pesquisa via redes sociais atinge níveis de aleatoriedade que nenhum outro mecanismo viável atingiria. Podemos comandar uma pesquisa por Facebook em que  milhões de pessoas recebem os questionários. Existem aplicativos, como o surveymonkey, que garantem total segurança contra manipulações por parte do eleitor. Logicamente que os questionários recolhidos deveriam ser ponderados de acordo com as variáveis sociológicas propostas pelo IBGE e é exigido pelo TSE. No entanto, para análises qualitativas e de diagnóstico de uma situação política ou em relação aos candidatos individualmente, a pesquisa de campo continuará insubstituível.

Metodologias de pesquisa

Nos últimos 13 anos em que participo de pesquisas eleitorais, já experimentei diversas metodologias de pesquisas. Experimentei pesquisas residenciais, muito utilizadas pelo Ibope. Depois, trabalhei com o método intecept usado pelo Datafolha, em que se pesquisa o eleitorado por fluxo em determinados pontos de concentrações de cada bairro. Trabalhei com pesquisas através do telefone, obedecendo às regras de distribuição amostral. Também trabalhei com pesquisas através de e-mail. No trabalho de campo, prefiro o método intercept, porque garante maior aleatoriedade, ou seja, garante acesso a todos os públicos da pesquisa. No método de pesquisa residencial, nossos coletores de dados nunca conseguiram acessar os condomínios fechados verticais e horizontais, assim como as zonas vermelhas dos bairros periféricos.  Experimentamos muitos assaltos aos nossos colaboradores. Esses acontecimentos comprometem demais as amostragens quando utilizamos o método de coleta de dados baseados em pesquisas residenciais.

Crise política

Creio que a crise expõe problemas sistêmicos de dimensão global, como a questão da falência financeira do Estado contemporâneo, e uma crise própria da cultura política predatória que se expressa na dimensão patrimonialista dos escândalos de corrupção que se apresenta em dimensão bilionária. A crise de dimensão global mostra-se devastadora e de maior agudeza nos países periféricos do sistema econômico mundial. A velha fórmula dos modelos de direita e esquerda, que sempre se alternaram na direção dos governos nacionais, parece esgotada. Até recentemente, os ciclos de alternância política na Europa e nos EUA tinham uma lógica que vinha contornando as crises econômicas sistêmicas: governos de direita equilibravam as contas públicas por meio de corte de gastos sociais, desemprego e arrocho salarial, portanto políticas contracionistas. Aproveitando o desgaste político da direita, a esquerda vencia eleições e turbinava políticas distributivistas, com aumento de gastos sociais. Mas o desequilíbrio das contas públicas, a alta de inflação e a falta da capacidade do governo em fazer investimento em infraestrutura para o crescimento econômico causavam a derrota da esquerda. Hoje, essa fórmula parece esgotada. As megassociedades nacionais apresentam alto grau de participação corporativa. A direita não consegue mais aplicar políticas econômicas contracionistas sem consequência eleitoral imediata. E a esquerda não consegue aplicar suas políticas distributivista em virtude da falência das finanças governamentais. Enfim, a marcha indelével da igualdade pré-anunciada por Alexis de Tocqueville, no século XIX, parece uma realidade inapelável, ou seja, nem a esquerda consegue gastar, nem a direita consegue produzir governos austeros. O resultado recente das eleições francesas demonstra a queda de partidos tradicionais de direita e de esquerda naquele país. Portanto as instituições políticas precisam ser reinventadas, pois o modelo atual parece que não responde, do ponto de vista formal e substantivo, a esta sociedade em ebulição.

O que esperar da crise nacional

De uma forma geral, podemos dizer que a crise que se instalou a partir do flagra de autoridades do poder executivo e legislativo brasileiro terá como consequência a melhoria das instituições que protegem o tesouro público, em detrimento de práticas predadoras contra as finanças públicas. Há que se fechar as torneiras pelos quais vazam o dinheiro público, além de apertar a legislação contra os crimes de colarinho branco e conceder o status de crime hediondo para os crimes cometidos por agentes públicos no exercício de funções públicas.

Os 60 anos da UFPA

A UFPA é um dos grandes experimentos brasileiros de como construir uma instituição universitária baseada no compromisso público, na gestão descentralizada, na vocação para se espraiar por todo o território paraense e na participação da comunidade nos destinos acadêmicos e políticos da instituição, tudo isso, após o regime militar de 1964. Efetivamente, em 1984, quando a UFPA realizou sua primeira consulta democrática direta, a UFPA era uma instituição efetivamente de Belém. A nossa Universidade não passava de uma instituição de ensino e extensão. A atividade de pesquisa constituía-se em iniciativa individual de alguns institutos e pesquisadores e não se conformava como uma política pública de gestão. Nos últimos 30 anos, a UFPA firmou-se como uma instituição acadêmica líder na Pan-Amazônia, implantou políticas de qualificação de pessoal docente e técnico--administrativo, expandiu-se para todas as meso e microrregiões do Pará, multiplicou o número de vagas para discentes e instalou políticas permanentes de apoio à assistência estudantil para os alunos com maior fragilidade social. Portanto a UFPA entrou no século XXI como uma ótima referência de como se trata a coisa pública com responsabilidade social e institucional, transparência pública e compromisso com o desenvolvimento humano, tecnológico e científico regional e nacional.

Ed.138 - Agosto e Setembro de 2017

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