Afeto, cuidado e proteção
Os efeitos do Método Canguru em mães adolescentes de prematuros
Por Isabelly Risuenho Foto Ascom Santa Casa
O processo da maternidade é único, cada mulher vivencia o maternar de forma particular e íntima. Os desafios e os sentimentos vividos variam a cada gestação, a cada parto e a cada cuidado com esse novo ser. As vivências como mulheres-mães, todas individuais e próprias, durante esses processos, são fundamentais para o desenvolvimento do vínculo mãe-filho. Mas, apesar da individualidade presente no processo da maternidade, existem fatores externos que determinam essas vivências, como a prematuridade de bebês gerados por mães adolescentes.
Os nascimentos prematuros atingem uma faixa de quinze milhões em todo o mundo e a maioria desses casos é associada ao baixo peso dos bebês. Essa realidade está ligada às mulheres que, possivelmente, tiveram uma gestação de risco, que pode ser desencadeada por diversos fatores, entre eles, a gestação na adolescência. Nesses casos, uma rede de apoio e um acompanhamento especializado são essenciais para garantir o crescimento e o bem-estar do bebê, além de auxiliar as mães a desenvolverem suas habilidades parentais, estabelecendo um vínculo afetivo com a criança.
Diante desse contexto, a professora, pesquisadora e terapeuta ocupacional Gabriela Ribeiro Barros de Farias desenvolveu a tese Mãe adolescente e o recém-nascido pré-termo e de baixo peso: Estudo sobre cuidado, vínculo e desenvolvimento no ambiente hospitalar. Defendida no Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento (PPGTPC/ NTPC) da UFPA, a pesquisa buscou observar o desenvolvimento neurocomportamental de bebês pré-termos e de baixo peso em consonância ao cuidado e à formação do vínculo entre a díade mãe-bebê, em uma unidade materno-infantil referência no Método Canguru.
Ao todo, participaram 31 díades, mães adolescentes, de 12 a 19 anos, e seus respectivos bebês pré-termos e de baixo peso, nascidos antes da trigésima sétima semana de gestação e com menos de 2,5 quilos, que estavam em acompanhamento na Unidade de Cuidado Canguru, do setor neonatal do Hospital Santa Casa de Misericórdia, em Belém. Vale ressaltar que nenhum dos bebês possuía algum tipo de má formação ou síndrome genética.
Vínculo mãe-bebê é afetado por questões sociodemográficas
A escolha de mães adolescentes foi feita em razão da fase precoce da vida em que elas se encontravam para exercer a maternidade. “A ideia foi, justamente, entender como esse vínculo estava se estabelecendo nessa fase da vida, considerando que esses bebês passam muito tempo internados e têm um risco em potencial para o desenvolvimento neurológico e de outros sistemas corporais, como o sistema respiratório e o sistema gástrico”, ressalta a professora Gabriela Ribeiro Barros de Farias.
Iniciada ainda em período de controle da covid-19, a pesquisa contou com a aplicação de ficha de avaliação neurocomportamental, ficha de avaliação de vínculo e um levantamento de dados sociodemográficos, além da realização de uma entrevista presencial com as mães. Com a coleta e comparação de dados, foi possível perceber que há uma correlação dos dados sociodemográficos com o padrão de vínculo que essa mãe estabelece, apesar de o processo de desenvolvimento acontecer de forma muito isolada em relação a isso. “O desenvolvimento desses bebês é muito individualizado. É como se esse processo de maturação cerebral ocorresse independente de fatores ambientais, a princípio”, explica Gabriela.
Pelas entrevistas, foi possível perceber que a relação de cuidado das mães com seus filhos é fundamental para o desenvolvimento neurocomportamental da criança. Em comparação com estudos feitos com mulheres-mães não adolescentes em todo o mundo, notou-se que os padrões de vínculo não se diferem em relação aos cuidados, ou seja, aquela adolescente, apesar da pouca idade, envolve-se com a situação, entende a importância e estabelece um vínculo de afeto, cuidado e proteção, empoderando-se, de fato, da função materna.
Outro dado importante observado nesta pesquisa foi em relação à rede de suporte social e familiar dessas mães: quanto maior era essa rede, melhor elas se adaptavam a todas as situações vivenciadas nesse processo de internação, contribuindo diretamente para a criação do vínculo mãe-filho. De acordo com a professora Gabriela Barros de Farias, esse dado é a principal contribuição desta pesquisa.
“Eu acredito que esses resultados têm um grande impacto, pois pudemos perceber a importância do acolhimento e como ele ajuda a mãe adolescente a superar as dificuldades da maternidade. Ficou claro que ter apoio nesse processo influencia, direta e positivamente, na construção do vínculo dessa mãe com esse bebê”, ressalta
Suporte da equipe hospitalar é crucial para as jovens mães
O ambiente hospitalar pode ser muito intimidante e desafiador para uma adolescente, e um bom trabalho oferecido pela equipe de saúde é crucial para o sucesso do desenvolvimento do bebê prematuro nesse ambiente. A equipe hospitalar deve garantir suporte e segurança às mães e aos seus familiares, considerando todos os aspectos sociais, emocionais e físicos envolvidos nesta situação.
Bebês que nascem com menos de trinta e sete semanas de gestação, ou seja, prematuros, são bebês que não vivenciam a fase de maior crescimento e especialização do cérebro, por isso possuem uma predisposição a possíveis lesões. O acompanhamento neurológico e comportamental de bebês nessa fase é voltado para a neuroproteção.
A Santa Casa de Misericórdia do Pará, em Belém, é a unidade de referência, na Região Norte, do Método Canguru, desde 2013. Utilizado na análise desta pesquisa, o Método Canguru tem como objetivo a neuroproteção. Baseado em uma assistência mais humanizada, ele procura tornar a maternidade, na adolescência, uma experiência positiva tanto para a mãe quanto para o bebê.
Os resultados do estudo também servirão de auxílio para toda a comunidade envolvida com a atenção à saúde, pois indicam a importância da orientação em relação ao planejamento familiar e à prevenção da gravidez na adolescência, de doenças sexualmente transmissíveis e dos riscos para a saúde de mães e bebês. Por isso a autora deve estender a pesquisa para um pós-doutorado.
“Há uma carência de pesquisas sobre essa temática. A incidência de gravidez na adolescência ainda é muito alta aqui, na Amazônia, e os serviços de saúde, de um modo geral, precisam ser ampliados para atender às necessidades da nossa comunidade. Vejo os resultados como o início de um processo importante na nossa região”, detalha Gabriela Ribeiro Barros de Farias.
Sobre a pesquisa A tese Mãe adolescente e o recém-nascido pré-termo e de baixo peso: Estudo sobre cuidado, vínculo e desenvolvimento no ambiente hospitalar foi defendida por Gabriela Ribeiro Barros de Farias, em 2022, no Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento (PPGTPC/NTPC), da Universidade Federal do Pará. A pesquisa teve a orientação da professora Celina Maria Colino Magalhães.
Beira do Rio edição 168
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