Entrevista: O grande desafio do momento
Período letivo emergencial põe inclusão digital em pauta
Por Walter Pinto Foto Alexandre de Moraes
Este mês, os estudantes da Universidade Federal do Pará (UFPA) retornaram às atividades acadêmicas interrompidas em março por causa da pandemia de covid-19. Para efeito de segurança, as aulas foram retomadas na modalidade de ensino remoto, o que se constituiu um desafio extraordinário para uma instituição localizada num estado de grande dimensão como o Pará, com mais de 50 mil alunos matriculados, dos quais 85% estão em situação de vulnerabilidade. Mas a Instituição trabalha para mitigar as dificuldades por meio de iniciativas com concessão de auxílios emergenciais para estudantes da graduação, da pós-graduação e do ensino básico, além de capacitação e inclusão digital. Nesta entrevista, o pró-reitor de Ensino da UFPA, Edmar Costa, explica como a Instituição vem se preparando para esta situação emergencial e enumera os avanços no ensino de graduação, ressaltando que “o maior desafio da atual gestão foi investir na transformação qualitativa”.
Ensino remoto
A proposta de desenvolver o ensino na forma remota é, sem dúvida, um grande desafio, considerando o perfil socioeconômico dos alunos da UFPA e a dimensão geográfica do estado. A UFPA possui mais de 50 mil alunos, somos a maior universidade pública em número de discentes, 85% dos quais em situação de vulnerabilidade socioeconômica (renda familiar per capita de até 1,5 salário mínimo). Além disso, a Universidade atinge, com os seus 12 campi e dezenas de polos universitários, mais de 60 municípios paraenses. Esta combinação (muitos alunos, a maioria em situação de vulnerabilidade socioeconômica, espalhados em locais diferentes e distantes entre si – com características regionais próprias de acesso à informação digitalizada) nos leva a concluir por um grande contingente de discentes com dificuldades de acesso às informações que trafegam pela internet. Eles representam o elemento com o qual a Administração Superior deve ter mais atenção, sob a forma de uma política institucional de inclusão digital já em execução, a qual deve ser absorvida como pauta permanente, pelos impactos positivos que pode ter no aprendizado e no engajamento dos discentes em seus cursos de graduação.
Auxílios emergenciais
Como parte das iniciativas para mitigar as dificuldades mencionadas anteriormente, a UFPA, por meio da Superintendência de Assistência Estudantil (Saest), publicou chamadas que autorizam a concessão de Auxílios Emergenciais de Apoio à Inclusão Digital para discentes de graduação, pós-graduação e ensino básico da UFPA, em situação de vulnerabilidade socioeconômica. Um destes editais está endereçado especificamente aos discentes com deficiência, com possibilidade de auxílio financeiro para aquisição de tecnologias assistivas. Já temos a garantia, por parte do MEC, de que todos os discentes que se inscreveram no Edital receberão o auxílio sob a forma de pacote de dados. Além disso, já há comprometimento de recursos da Instituição que possibilitarão a compra de equipamentos para pelo menos 3.500 discentes, o que representa um investimento superior a quatro milhões de reais.
Inclusão digital
Temos o entendimento de que este período letivo emergencial será marcado por desafios, não apenas para discentes, nossa maior preocupação pelo quantitativo e pela heterogeneidade, mas também para o corpo de docentes, habituados a cursos oferecidos tradicionalmente na forma presencial. Nossos docentes, em sua ampla maioria, não fazem planejamento de ensino voltado para ambientes distanciados dos alunos, não dominam as metodologias do ensino remoto e muitos deles mostram-se resistentes ao entendimento de que essas metodologias são hoje imprescindíveis, para uma conjuntura muito específica e emergencial, sem que isso represente a transformação automática e definitiva de nossos cursos presenciais em cursos a distância. O uso correto das tecnologias, tanto por parte de discentes como de docentes, também representa um desafio importante, daí a necessidade de capacitação para o uso de tecnologias de informação e comunicação, sob forma de cursos e oficinas oferecidos pela UFPA.
Aulas práticas e internato
A portaria que permite substituir ensino presencial por atividades não presenciais (Portaria MEC nº 544/2020) destaca que a substituição deve obedecer ao que está previsto nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) para cada curso. Por exemplo, no caso do curso de Medicina, as DCNs do curso permitem um máximo de 20% de atividades não presenciais na realização do internato médico, o que impede o cumprimento integral desse componente de modo remoto. Dessa forma, a Resolução aprovada na UFPA permite que a coordenação do curso avalie essa excepcionalidade e elabore, com os seus docentes e com a participação da representação discente, um plano de trabalho para que, nesse caso específico, seja possível realizar o estágio com momentos presenciais, resguardadas as condições de biossegurança e sanitárias indicadas pelos órgãos de saúde. Fora dessas situações específicas, que envolvem a finalização do curso de graduação, entende-se que o melhor caminho é que esses componentes como práticas profissionais de estágios ou práticas que exijam laboratórios especializados devam ser ofertados em momento futuro, quando houver segurança para que sejam realizados de forma presencial.
Avanços na graduação
Do tripé de missões da UFPA, o ensino de graduação constitui o eixo que dá origem a qualquer Instituição de Ensino Superior. Depois de anos de expansão da educação superior (investimentos, ampliação da estrutura e do número de campi, mais matrículas, cursos novos etc.), o desafio da atual gestão foi investir na transformação qualitativa do ensino de graduação. Do ponto de vista estrutural, a Pró-Reitoria sofreu reformulação, com a proposição de novas divisões, que deram mais agilidade ao trabalho e acrescentaram novas funções no planejamento estratégico da Unidade. Um programa de investimento em infraestrutura física (editais Labinfra), que apoiou projetos para instalação/recuperação de laboratórios de ensino, beneficiou mais de trezentos projetos/laboratórios, tanto em Belém como nos outros campi, com impacto inegável na qualidade do ensino oferecido pelas subunidades. A execução orçamentária deve representar, em quatro anos, quase R$ 20 milhões, entre recursos de capital e custeio, considerando que o edital prevê o financiamento de recursos adicionais de consumo por projeto, por até quatro anos, além da concessão de bolsas de monitoria, que possibilitam o envolvimento de discentes na empreitada. A gestão também realizou forte investimento na modernização dos ambientes de aulas geridos pela Proeg, como Mirante do Rio, espaços de ensino no Campus Profissional, e nas diversas áreas em todos os campi.
Flexibilização curricular
Criamos a possibilidade de flexibilização curricular dos cursos de graduação, cujo piloto, ora em execução, já permite que discentes tenham acesso a uma formação mais multidisciplinar/interdisciplinar, construindo parte de seu percurso acadêmico com base em interesses intelectuais e profissionais não previstos nos projetos pedagógicos de seu curso. Outras iniciativas incluem: a) um Programa de Acompanhamento dos Cursos de Graduação; b) o Programa GestQuali, que prevê a inserção de servidores com formação em Administração para mapear processos acadêmicos nas unidades e nas subunidades acadêmicas e que deve reverter em maior eficiência na gestão, além de mitigar os efeitos da transição entre mandatos de diretores das faculdades e das unidades; c) a ampliação dos programas de monitoria e do Programa Institucional de Bolsa de Iniciação à Docência (Pibid), a institucionalização do Programa de Residência Pedagógica e a restauração do Programa de Autoavaliação Institucional, o Avalia!, incorporado ao Sigaa, que fornece importantes indicadores para a melhoria da gestão acadêmica e da qualidade do ensino, baseado nos questionários preenchidos por discentes e docentes, ao final de cada período letivo.
Ed.156 - Set/Out/Nov de 2020
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