Chorume contamina a bacia do Aurá
Camarão, peixe e caranguejo indicam a presença de metais
Por Adrielly Araújo Foto Acervo da Pesquisa
De acordo com dados de 2020 da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), na Região Norte 79% das cidades encaminham seus resíduos para aterros controlados ou lixões.
O Pará está entre os 15 estados com o maior número de unidades de destinação inadequada de Resíduos Sólidos Urbanos (RSUs). São 137 lixões ou aterros, que geram 3.860 toneladas de resíduos por dia. Essa quantidade, de acordo com a Abrelpe, é despejada em destinos inadequados e afeta, ao todo, mais de quatro milhões de pessoas no estado.
A decomposição desses resíduos resulta em diversos subprodutos, como o chorume (líquido proveniente da lixiviação da água da chuva mais a decomposição da matéria orgânica), que é extremamente tóxico e pode contaminar rios adjacentes aos lixões, como é o caso dos rios Aurá e Uriboca, próximos ao lixão do Aurá, na Região Metropolitana de Belém.
Com o tratamento inadequado dos lixões, também podem chegar ao meio ambiente elementos como: arsênio (As), cádmio (Cd), chumbo (Pb), mercúrio (Hg) e os Elementos Terras Raras (ETR), grupo formado por 17 elementos metálicos que possuem propriedades físicas e químicas similares, frequentemente utilizados em produtos de alta tecnologia, como lâmpadas fluorescentes, celulares, baterias e computadores.
Apesar da grande concentração de As, Cd, Pb, Hg, REEs e do chorume no meio ambiente, pouco se sabia a respeito da toxicologia e das características de bioacumulação desses elementos nos organismos. Hoje, essas informações podem ser encontradas no estudo Metais em organismos aquáticos expostos a chorume das bacias hidrográficas do rio Aurá, Amazônia, Brasil, da pesquisadora Brenda Natasha Souza Costa.
Resultados sugerem potencial risco à saúde humana
Na tese orientada pelo professor Marcelo de Oliveira Lima e apresentada no Programa de Pós-Graduação em Ecologia Aquática e Pesca (PPGEAP), do Núcleo de Ecologia Aquática e Pesca da Amazônia (NEAP/UFPA), foram realizadas quatro amostragens, em períodos seco e chuvoso, nos rios Aurá e Uriboca. “Nas oportunidades, capturamos camarões da espécie Macrobrachium amazonicum e caranguejos Minuca mordax e compramos, com moradores locais, peixes da espécie Propimelodus eigenmanni”, conta Brenda Natasha Souza Costa.
De cada organismo, foram mensurados peso, comprimento e largura, retirados o músculo e outros órgãos do sistema hepático e respiratório para análise. A dosagem de arsênio (As), cádmio (Cd), chumbo (Pb), mercúrio (Hg) e Elementos Terras Raras (ETR) foi realizada por Espectrometria de massa com plasma indutivamente acoplado (técnica que determina a concentração de elementos metálicos mesmo em pequenas quantidades), no Instituto Evandro Chagas e na Universidade de Nantes, na França.
Com os resultados obtidos, foi observado que os caranguejos tendem a ter maior acúmulo de As, Cd, Pb, Hg e ETR que os camarões e os peixes. “No período seco, os espécimes das três espécies apresentaram maiores concentrações dos elementos metálicos do que no período úmido analisado. Em relação aos organismos, as concentrações de As, Pb e Hg (o cádmio não entrou nessa análise, pois sua presença nos animais foi mínima) nas brânquias do camarão e do caranguejo e no fígado do peixe foram maiores que nos demais tecidos”, relata Brenda Natasha Souza Costa.
De acordo com a pesquisadora, o quociente de risco (HQ) à saúde humana foi aplicado somente aos camarões e aos peixes analisados, pois a espécie de caranguejo usada no trabalho não desperta interesse comercial, em virtude do diminuto tamanho.
“O valor do quociente de risco à saúde no camarão e no peixe para todos os elementos (com exceção do chumbo no camarão) foi superior a 1, sugerindo um potencial risco à saúde humana. O HQ nos peixes é 20 vezes superior que o calculado para os camarões”, revela a bióloga. “O ciclo sazonal interfere significativamente no acúmulo de metais, assim como os lixões. Com base nessas informações, ficou evidenciado o grande risco à saúde humana pelo consumo destas proteínas”, conclui a autora.
Beira do Rio edição 159
Comentários
Poxa, vamos respeitar (e valorizar) mais nossos pesquisadores.