Danos extrapatrimoniais e invisíveis
Pesquisa analisa casos de violência psicológica julgados pelo TJPA
Por Leandra Souza Foto pexels-anete-lusina
A opressão que as mulheres vivenciaram e, infelizmente, ainda vivenciam é resultado de um processo histórico que nutre o ódio pela existência feminina. Isso ocorre porque, há séculos, as mulheres têm a individualidade controlada por um sistema de poder que rege a sociedade e atende, majoritariamente, aos interesses patriarcais. E o efeito desse domínio social (liderado por homens) é o machismo, que, por sua vez, fere a integridade física, psicológica e patrimonial de cada mulher.
Na intenção de entender os efeitos desse controle patriarcal no meio (ambiente jurídico) judiciário paraense, a pesquisadora Lorena Meirelles produziu a dissertação O dano existencial decorrente da violência psicológica no âmbito doméstico e familiar contra a mulher: uma análise dos julgados junto ao Tribunal de Justiça do Estado do Pará, apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Direito da UFPA (PPGD/ICJ), sob a orientação da professora Pastora Leal.
No estudo, Lorena Meirelles procurou destacar a Teoria da responsabilidade civil, que busca compreender as desigualdades que permeiam as relações existentes entre homens e mulheres. A dissertação da advogada observa a extensão do dano extrapatrimonial sofrido por mulheres que foram vítimas de violência psicológica no âmbito doméstico e familiar, praticada por seus parceiros ou ex-parceiros afetivos.
“O meu objetivo foi identificar quais os parâmetros de quantificação são utilizados pelo Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA) para arbitrar o dano nos casos concretos desde a promulgação da Lei Maria da Penha (N°11.340). A intenção foi analisar se os critérios utilizados são suficientes para, de forma efetiva, exercer o papel indenizatório da responsabilidade civil”, declara Lorena.
Dados foram coletados em site do JTPA e Jusbrasil
Para colher informações sobre os casos de interesse ao estudo, a bacharela em Direito utilizou como meio de busca os sites do TJPA e do Jusbrasil. Ambos auxiliaram na busca por uma investigação qualitativa das sentenças e dos acórdãos proferidos pelo Tribunal do Estado, referente à violência doméstica dirigida às mulheres paraenses.
Primeiramente, a advogada direcionou a sua pesquisa ao site do TJPA, que, segundo ela, obteve um “resultado insatisfatório”. "A amostragem inicial deste estudo procurou realizar uma pesquisa jurisprudencial no Repositório On-Line de Jurisprudência do TJPA, tendo como palavras-chave: ‘violência doméstica psicológica’. Contudo a maioria dos processos identificados não estava relacionada ao tema estudado”, afirma a autora.
Diante dessa dificuldade, Lorena resolveu procurar informações mais viáveis no site Jusbrasil. “O referido instrumento não somente abrange as decisões de 2º grau de jurisdição, mas também fornece decisões das varas cíveis e criminais vinculadas ao âmbito do TJPA na esfera de 1º grau de jurisdição, de forma que a pesquisa se dá baseada no balanço de uma realidade mais próxima dos casos concretos”, destacou.
Violência psicológica e os custos do dano invisível
A violência psicológica está entre os cinco “tipos de violências contra as mulheres” que se enquadram na Lei Maria da Penha, os demais são: violência física, sexual, patrimonial e moral. No entanto, por não deixar marcas ou sequelas corporais nas vítimas, é bem mais difícil de ser identificada. A autora da dissertação garante que se trata de uma violência que causa “uma perda existencial, capaz de atingir a esfera extrapatrimonial da vítima, culminando em um dano invisível e de difícil comprovação, que dificulta o seu reconhecimento jurídico e a análise de sua extensão".
Um extrato dessa realidade é o próprio processo de pesquisa e apuração dos casos coletados pela advogada. Em sua análise, apenas nove processos foram identificados com o envolvimento direto a danos extrapatrimoniais, oriundos de violência psicológica praticada por parceiros ou ex-parceiros das vítimas. Algo que, de acordo com a pesquisadora, exprime o descaso e a violação dos direitos das mulheres por parte do Poder Judiciário do Pará.
“Com isso, percebe-se que as decisões do referido órgão não estão fundadas em qualquer perspectiva de gênero apta a ser instrumento de combate às violências praticadas em face às mulheres, atentando diretamente aos direitos humanos das vítimas”, declara a autora.
Lorena Meirelles assegura que a sua dissertação vai além dos muros da academia ao propor a defesa das mulheres, não só como pesquisadora, mas também como feminista. “Entendo que a responsabilidade civil é apenas mais uma ferramenta responsável pela defesa dos direitos das mulheres. Então a minha contribuição social é justamente focar na necessidade de proteção e de assistência social a todas as mulheres que sofrem violência doméstica”.
Beira do Rio edição 165
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