Resenha
A Bioética e a dignidade das pessoas com deficiência
Raimundo Wilson Gama Raiol
A Bioética tem despontado como uma das mais importantes áreas do conhecimento na atualidade em razão de sua transversalidade para tratar de temas polêmicos, com base em aspectos filosóficos, morais e políticos, em especial, sobre os conflitos característicos dos tempos ora vivenciados.
O desenvolvimento da tecnologia, a modificação da percepção de sujeito, o relativismo ético, o avanço do mercado médico e a artificialização de eventos naturais da vida como nascimento, reprodução e morte, têm exigido um reflexivo debate bioético sobre direitos humanos e a proteção dos grupos sociais vulneráveis.
É isso que propõe Evandro Alencar, jovem pesquisador, advogado especialista em Bioética e Direito das Pessoas com Deficiência e doutorando no Programa de Pós-Graduação em Direito, do Instituto de Ciências Jurídicas da Universidade Federal do Pará, no livro Uma abordagem bioética sobre os direitos reprodutivos: entre o utilitarismo médico e o reconhecimento da dignidade das pessoas com deficiência, lançado pelo selo da Paco Editorial.
O livro, em apertada síntese, apresenta três pilares. O primeiro deles traz uma reflexão bioética acerca do cenário do avanço biotecnológico e a imprescindibilidade de proteção aos direitos humanos das pessoas com deficiência, o risco de desenvolvimento de estudos científicos sem atenção a um regramento ético mínimo e também uma ponderação acerca da aplicação dos princípios da prevenção e precaução, nessas práticas.
No âmbito do segundo pilar, há relevante discussão sobre a consolidação dos direitos reprodutivos e sua associação ao momento de expansão da medicina reprodutiva, bem como trata sobre dilemas relacionados à genética, ao transumanismo e ao utilitarismo médico, objetos que resultam, conforme o entendimento do autor, na necessidade de uma afirmação e de reconhecimento da dignidade humana da pessoa com deficiência.
No terceiro pilar, o autor trata sobre a manifestação do tema nas esferas de decisões individuais e em nível de Estado, evidenciando uma política de controle populacional e o risco da retomada de visões eugênicas, contrárias aos direitos humanos, que, por isso, devem ser combatidas, em face da crescente promoção de procedimentos oferecidos pela medicina preditiva e reprodutiva, como esterilização compulsória, manipulação genética e abortamento eugênico, que expressam atos de discriminação em razão da deficiência, característico de um cenário de neoeugenia, totalmente descabido.
Além disso, a obra apresenta boa articulação de conceitos, como “utilitarismo médico”, cunhado pelo autor para indicar a conduta voltada ao uso de informações médicas e científicas para justificação de ações em prol de resultados individualmente desejados – muitas vezes egoístas, consequencialistas e pautadas em um viés de custo-benefício – sem uma percepção ética comunitária, o que se apresenta distante de uma perspectiva inclusiva e valorizadora da dignidade da pessoa humana.
Assim, recomenda-se a leitura, pela excelência com que o tema ganha profundidade, no âmago da obra ora mencionada, vez que se apresenta como uma leitura indispensável para todos e todas que buscam esclarecimentos sobre o polêmico e, ao mesmo tempo, instigante assunto relacionado às novas dinâmicas sobre os direitos reprodutivos, as tecnologias médicas e a existência das pessoas com deficiência, cuja dignidade deve ser preservada.
Raimundo Wilson Gama Raiol – é doutor em Direitos Fundamentais e Relações Sociais (2008), pelo Programa de Pós-Graduação em Direito (ICJ/UFPA), professor associado 4 na Faculdade de Direito e no Programa de Pós-Graduação em Direito da UFPA. E-mail: <rwraiol@gmail.com>
Edição Rosyane Rodrigues - Beira do Rio ed.166
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