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Entrevista: Tadeu Oliver: 47 anos de magistério

Publicado: Terça, 26 de Dezembro de 2023, 16h16 | Última atualização em Segunda, 19 de Fevereiro de 2024, 19h35 | Acessos: 749

Mesmo aposentado, professor continuará atuando de forma voluntária e manterá luta pela educação

#ParaTodosVerem: Fotografia de um homem idoso. Ele está sentado diante de estantes de cor vermelha e completamente preenchidas por livros. Tem cabelos, barba e bigode brancos, sorri e usa óculos. Está vestido com uma calça jeans azul e blusa de listras finas e gola de cor laranja.
#ParaTodosVerem: Fotografia de um homem idoso. Ele está sentado diante de estantes de cor vermelha e completamente preenchidas por livros. Tem cabelos, barba e bigode brancos, sorri e usa óculos. Está vestido com uma calça jeans azul e blusa de listras finas e gola de cor laranja.

Por Carla Silva Fotos Alexandre de Moraes

Em 2023, o professor Tadeu Oliver Gonçalves completou 47 anos de magistério, os quais foram e ainda são dedicados diariamente para construir uma sociedade melhor por meio da educação. A carreira no magistério superior iniciou em 1976, quando foi contratado como professor colaborador do Departamento de Matemática da Universidade Federal do Pará (UFPA). Desde então, sua história tem sido marcada pela dedicação e luta em prol do ensino, não apenas como professor, mas também como líder e gestor dentro e fora da Universidade.

Do currículo, podemos destacar a participação na reestruturação do curso de Licenciatura em Ciências do 1º Grau, a coordenação do curso de Licenciatura em Ciências, a direção do Centro de Ciências Exatas e Naturais (CCEN) - atual Instituto de Ciências Exatas e Naturais (Icen), a nomeação conquistada após vencer a 1ª eleição direta e universal para o cargo no CCEN.

Tadeu Oliver Gonçalves também ocupou a direção do Departamento de Registro Acadêmico (Derca) - atual Centro de Registros e Indicadores Acadêmicos (Ciac). Em 2003, foi nomeado presidente do Conselho Estadual de Acompanhamento e Controle Social do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef). Participou da criação e implementação dos cursos de Mestrado e Doutorado em Ensino de Ciências e Matemáticas, bem como do Instituto de Educação Matemática e Científica (IEMCI), no qual exerceu o cargo de diretor-adjunto. Em 2020, assumiu, de forma interina, o cargo de reitor da UFPA.

Quase cinco décadas na UFPA

Eu não fiz tudo o que eu gostaria, mas fiz aquilo que foi possível. Eu acredito que a Universidade precise dar maior atenção aos cursos de formação de professores, às licenciaturas, porque a nossa responsabilidade é muito grande. Nós preparamos profissionais para trabalhar nos ensinos fundamental e médio e, no meu ponto de vista, as próprias pesquisas mostram isto: a universidade não está dando conta da formação de um professor de forma apropriada. Muitos dos nossos formadores não sabem o que é uma escola pública ou uma escola de periferia. Na escola pública, você encontra alunos de níveis diferentes, com problemas sociais diferentes, e nós formamos um professor como se ele fosse encontrar um aluno ideal. Vivenciei essa problemática quando fui diretor de Ensino. Falta diálogo entre a universidade - que prepara -  e as Secretarias Estadual e Municipal de Educação – que empregam esses professores. 

Ser professor

Optei por fazer licenciatura porque achava que teria dificuldade de passar em engenharia. Depois de três anos, naquela época era permitido, eu fui fazer engenharia. Não me adaptei, fiquei como professor e não me arrependo disso.

Escola pública

Na época em que eu entrei na universidade, não demorei a ensinar em escolas públicas e particulares e foi muito importante. Nós trabalhávamos aqui e íamos para as escolas públicas. Eu abordo essa troca na minha tese. Defendo que o professor que trabalha com curso de formação deve passar pelo menos um semestre na escola pública para ser sensibilizado pelo seu público. Há pesquisas que mostram que o aluno de escola pública só estuda quando está em sala de aula. O ideal seria que os pais acompanhassem o desenvolvimento dos seus filhos, mas a realidade é diferente. No meu caso, por exemplo, minha mãe era analfabeta, ela me mandava estudar, mas não sabia se eu estava estudando ou não. É importante que a família ajude na formação dos seus filhos, mas essa não é a realidade da maioria. Acho que falta aos professores essa sensibilidade.

Compromisso

Nosso compromisso é fazer da educação aquilo que almejamos: algo que possa modificar o sujeito e a sociedade. Vou conseguir sozinho? Claro que não! Como diz um colega, às vezes há um incêndio na floresta e um passarinho leva um pouquinho de água para tentar apagá-lo, enquanto o outro diz: “Não vai adiantar”. Ao que ele responde: “Estou fazendo a minha parte”. Eu digo o mesmo. Meu sonho é ver o ensino na universidade melhor do que é hoje.

Experiência em gestão

Nunca saí de sala de aula porque é lá que estão os problemas reais. É cansativo, mas ela nos alimenta e nos dá vida. Foi com essa experiência que, como gestor, pude pensar e criar estratégias para ter melhores condições de trabalho. 

Aposentadoria

Vou continuar trabalhando, mas só na pós-graduação e na formação de professores, minha área de pesquisa. Agora, com mais tempo, poderei me dedicar ainda mais para isso. Enquanto eu tiver condições – físicas e mentais – para lutar por uma educação melhor, eu farei.

Faria diferente

Gostaria de criar um local para tratar apenas das licenciaturas. Além disso, daria uma formação para que os nossos alunos pudessem dar conta de atender às necessidades da escola pública, incentivando-os a fazer diferente, sempre dedicados a promover uma educação melhor. Essa é uma das minhas lutas, e eu não vou desistir. 

Vontade de desistir 

Senti quando fiquei cansado, porque você batalha e não vê resultado. Eu vinha de uma leva de gestão, e os entraves burocráticos foram me desanimando. Nessa época, a professora Terezinha Valim, minha esposa, decidiu fazer doutorado. Pedi licença por um ano e decidi acompanhá-la. Na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), participei de grupos de pesquisa, fiz a seleção e acabei fazendo o curso de doutoramento também.

Casamento

Isso ajuda na nossa caminhada, um dá força ao outro e o apoia. A nossa vida é a Universidade. 

Tadeu como reitor

Foi algo que eu jamais pensei. Houve a eleição, que foi um dos processos mais tran­quilos que já aconteceram na Universidade. Mas, em Brasília, não queriam acatar a decisão da comunidade universitária. E, para que não houvesse uma interven­ção na UFPA, como decano, eu poderia assumir o cargo e aceitei com um único objetivo: defender a Universidade. Eu nunca pensei em ser reitor, pois não tenho temperamento para isso. Ao fim, a decisão da comunidade universitária prevaleceu e o professor Emmanuel Tourinho assumiu o cargo para o qual foi eleito.

 Vaidade 

Ter feito tudo o que pude fazer em prol das licenciaturas para ajudar as pessoas que precisavam. Eu fico satisfeito quando vejo meus alunos fazendo o melhor pelo ensino. Sempre que recebo o feedback de um aluno que alcançou voos maiores, meu coração fica muito feliz.

 Pós-Graduação 

Nossa grande briga começou com o Clube de Ciência. Os alunos da licenciatura pediam para ter aula prática, mas nós vivíamos num contexto histórico de final da Ditadura Militar no Brasil e não era fácil conseguir parceiros. Mas corremos atrás, construímos vários projetos, fizemos parcerias com o Museu Paraense Emílio Goeldi, até que o Clube de Ciências cresceu a ponto de já não ter mais espaço. Como eu era diretor do Centro de Exatas, o Clube foi para lá. Em virtude de as atividades estarem aumentando cada vez mais, criamos o Núcleo Pedagógico de Apoio ao Desenvolvimento Científico (NPADC), em que foi instituído o mestrado. Naquele momento, percebemos que estávamos trabalhando só numa ponta, então fizemos cursos em diversos municípios do estado.

O Instituto de Educação Matemática e Científica (IEMCI) começou com a pós-graduação e depois implementou o curso de Graduação em Licenciatura Integrada em Ciências Matemática e Linguagens.

Quando o mestrado foi criado, não tínha­mos funcionários nem professores. Batemos de porta em porta, fomos na Física, Matemática, Biologia, Geologia, agregando pessoas que tinham sensibilidade. Por ocasião do Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expan­são das Universidades Federais (Reuni), defendi que fizéssemos concurso para candidatos com o título de mestre e me comprometi que todos os professores aprovados fariam o doutorado. Foi o primeiro embate na Câmara de Ensino, mas conseguimos passar a proposta e, hoje, todos os professores do quadro são doutores, assim como a gestão está com ex-alunos nossos.

Na época, o número de doutores lo­cais era bem pequeno, então o concurso aprovaria pessoas de outros estados, que, naturalmente, passariam pouco tempo por aqui e logo pediriam transferência para as suas cidades de origem.

Nosso curso não é perfeito, mas estamos sempre fazendo avaliações e buscando o aperfeiçoamento. Tivemos professores que deram contribuições fantásticas, tanto que o único projeto que existe há tanto tempo na Universidade é o Clube de Ciências. Chegamos a ser expulsos da Universidade, quando um reitor nos chamou para dizer que a UFPA não era lugar de criança. Isso há uns trinta anos. Mas não desistimos e levamos o projeto para a Escola Padre Leandro, no bairro Guamá. Voltamos para o campus após o mandato desse reitor. Quando eu olho essa história, eu a vejo como uma história de lutas. Tem que ter muita certeza do que se quer, senão você desiste.

CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/6789250569319668

Beira do Rio edição 169

 

 

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