Resenha
A Amazônia no telejornalismo
Por Walter Pinto Foto Reprodução Alexandre de Moraes
Na apresentação de À sombra da floresta – a Amazônia no jornalismo de televisão, a jornalista e professora da Faculdade de Comunicação (Facom) e do Programa de Pós-Graduação Comunicação, Cultura e Amazônia (PPGCOM/ILC) da UFPA Vânia Maria Torres Costa aproxima o objeto da sua pesquisa às representações científicas dos viajantes e naturalistas do século XIX a respeito de território, sociedade e dinâmicas ambientais, que ajudaram a formar o imaginário social sobre a Amazônia. O foco do seu livro é o telejornalismo como lugar de construção de um imaginário sobre a Amazônia, observada a especificidade discursiva do meio. Seu interesse é, com base na reflexão sobre a representação no jornalismo, investigar como a Amazônia é discursivamente concebida no cenário nacional.
Na busca de seu objetivo, a autora analisa discursos históricos e científicos sobre a Amazônia e as formas de reatualização desses discursos pelos jornalistas de televisão. Procura também “analisar a relação entre produção de identidade e alteridade para problematizar por que as notícias são como são”. Na investigação das representações dos sujeitos amazônicos na produção televisiva, Vânia Torres faz uso de seu lugar de fala, do alto de uma experiência profissional de dezesseis anos ininterruptos como jornalista de TV. A autora vale-se também do diálogo com textos da História, da Sociologia, da Antropologia, da Literatura, incluindo narrativas de antigos viajantes e naturalistas e textos atuais que trazem apropriações da região.
À sombra da floresta: a Amazônia no jornalismo de televisão nasceu como tese de doutorado na Universidade Federal Fluminense (UFF) e foi adaptada para o formato de livro. No prefácio, a jornalista e doutora em Antropologia do Museu Nacional e professora da UFF Ana Lucia Enne, orientadora do estudo, destacou a seriedade das reflexões da autora, na busca de fontes, nas análises de programas e séries, na construção de metodologias originais e na criação de sistemas de análise e comparação, para lidar com os dados que coletou.
O livro está estruturado em seis capítulos. O primeiro, Memória e Esquecimento em Disputa para Falar de Muitas Amazônias, problematiza os diversos discursos produzidos historicamente sobre a Amazônia, desde a ocupação da terra pelos europeus até os dias atuais. O segundo, Telejornalismo e Noticiário Nacional: Tecendo o Brasil Todos os Dias, busca fazer a contextualização do surgimento da televisão como produção do “real”. A autora aborda as especificidades do jornalismo de rede e a lógica das matérias especiais.
No terceiro capítulo, Telejornalismo e Identidades Amazônicas: Produzindo Significações no Campo Midiático, Vânia Torres reflete sobre a atuação do jornalista como autor e suas escolhas na construção das identidades amazônicas. Com foco no texto audiovisual, identifica significados produzidos com as imagens, o texto verbal, a atuação do jornalista e os escolhidos para falar, as chamadas “fontes”.
A partir do interesse despertado pela floresta e suas riquezas nos campos político, econômico e ambiental, espécie de “tesouro” cobiçado pelo mundo inteiro, a autora, no quarto capítulo, Construindo uma Ideia de Região: “Outro Brasil, Outro Mundo”, analisa como esse tesouro agrega formações ideológicas nos telejornais da Rede Globo, identificadas com base na separação do texto em formações discursivas.
O quinto, O Discurso Salvacionista: entre Imensidão, Exaltação e Ilegalidade, mostra as representações jornalísticas sobre a floresta, nas quais, com frequência, a selva surge apartada da região e das pessoas, como observa Vânia Torres. No sexto e último capítulo, A Colonização do Discurso: Poder e Saber na Construção dos Sujeitos Amazônicos, o livro/tese da autora, com um olhar da margem, discute a relação civilizado/primitivo na produção jornalística nacional da Rede Globo sobre a Amazônia, com ênfase na subalternidade e invisibilidade como percursos para reflexão sobre as séries selecionadas para estudo.
Entre as conclusões, a autora diz que as representações sobre a Amazônia, ofertadas como um ‘nunca antes visto’ pelos jornalistas da TV Globo, são atravessadas por discursos localizados em tempos e campos diferentes, em reportagens, “aparentemente escorregadias aos olhos dos telespectadores, que, de tanto serem mostradas da mesma maneira, remetem a uma permanente reafirmação de relações de superioridade e inferioridade entre a Região Norte e o Brasil”.
Vânia Torres alerta para a urgência de problematizarem-se as relações de poder e saber, de dominação e exploração, materializadas nos fluxos audiovisuais dos veículos de comunicação, seja nos programas de entretenimento, seja no jornalismo. Ao final, ela adverte profissionais e estudantes de Jornalismo para estarem “motivados a alterar a ordem produtiva que hierarquiza saberes e vive à caça de anormalidades e diferenças na periferia”.
Serviço – À sombra da floresta: a Amazônia no jornalismo de televisão. Vânia Maria Torres Costa. Editora: Paka-Tatu, 2022. Nº de páginas: 258. Fale com a autora: vaniatorrescosta@gmail.com
Beira do Rio edição 167
Redes Sociais