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A escrita de si Tembé -Tenetehara

Publicado: Sexta, 12 de Agosto de 2016, 17h05 | Última atualização em Terça, 16 de Agosto de 2016, 17h43 | Acessos: 3779

Em campo, índios contaram suas histórias em quadrinhos

Abaixo, resultado das oficinas de quadrinhos realizadas pelo pesquisador na aldeia.
imagem sem descrição.

 

Por Maria Luisa Moraes Fotos Acervo do Pesquisador

Para os de fora, a Amazônia parece um lugar distante, associado à floresta. Os indígenas são tidos como pessoas que não falam nossa língua e são muito diferentes de nós. A mídia é uma das responsáveis por cristalizar essa ideia. Há clichês por toda parte nos produtos da indústria cultural que consumimos. O quadrinhista Otoniel Oliveira escreveu a sua Dissertação Etnografia em Quadrinhos: Subjetividades e escrita de si Tembé-Tenetehara, defendida no PPGCOM-UFPA, inspirado também por essa problemática.

Otoniel conta que, desde criança, gosta de quadrinhos. “Eu sempre desenhei. Nos quadrinhos, você encadeia os desenhos dentro de uma sequência lógica, que conte alguma história. Então, inicialmente, comecei fazendo quadrinhos sobre o que eu gostava: filmes, super-heróis e coisas fantásticas. Depois, fiz quadrinhos sobre situações e observações da vida”, conta ele.

O pesquisador decidiu abordar a temática indígena usando os quadrinhos para desconstruir os estereótipos sobre essa população. Participante do Grupo de Estudo Mediações, Discursos e Sociedades Amazônicas (GEDAI), vinculado ao IFCH/UFPA, Otoniel já havia realizado estudos sobre a sociedade Tembé-Tenetehara e outras sociedades indígenas.

Sob orientação da professora Ivânia Neves, ele foi a campo pela primeira vez.  A professora também sugeriu que o pesquisador levasse a linguagem dos quadrinhos para ser trabalhada em campo. Na dissertação, Otoniel estudou quadrinhos que retratavam indígenas, a maioria, publicações nacionais, mas também um quadrinho de outro país da América do Sul e um europeu.

“A representação tende a uniformizar a imagem do indígena partindo da espetacularização e mais superficial do que eles são. Esquecem as particularidades, as idiossincrasias e os detalhes que fazem com que cada etnia seja rica em si mesma”, lamenta o pesquisador.

Um exemplo citado é o da pintura corporal indígena. Em todos os quadrinhos analisados, ela não existe, ou, quando existe, não há um cuidado com seu significado, estando ali apenas por uma questão estética. “Olha só que curioso o Papa Capim, exemplo de imagem de indígena estudado. Ele é um indígena, mas não tem grafismos. Ele nunca apareceu com pinturas em nenhuma história que eu vi, apesar de a pintura ser muito importante para esses povos”, informa Otoniel.

Pesquisador repensou a sua própria produção

Durante o trabalho de campo, o pesquisador percebeu que costumava cair nesses clichês quando representava indígenas em seus quadrinhos. “A maneira como analisei outros quadrinhos, eu utilizei para analisar os meus próprios trabalhos. A partir de agora, eu faço quadrinhos com uma responsabilidade muito maior, com a visão da pesquisa acadêmica”, avalia.

Otoniel Oliveira ministrou oficinas de quadrinhos na aldeia e fala sobre a experiência: “eles têm a mesma curiosidade, têm muita habilidade e muitas referências, mas o que eles falam é muito diferente do que nós falamos. Nós somos muito contaminados pela indústria cultural”, observa.

Essa forma de falar de si está presente nos resultados das oficinas. Os Tembé-Tenetehara têm uma grande consciência de quem são, se autorretratam com propriedade e orgulho. “Eles têm TV aberta, alguns têm TV por assinatura, ou seja, também são ‘bombardeados’ pela indústria cultural, mas eles utilizam essa influência de um jeito diferente, eles falam de si com respeito e responsabilidade”, afirma.

Ao comentar os resultados da oficina, o cacique Naldo Tembé questionou se os elogios de Otoniel eram sinceros. “Eles estão acostumados com pesquisador indo até a aldeia achando tudo que eles fazem maravilhoso e, depois, não voltam com os resultados da pesquisa. Eles não gostam disso, querem ser questionados, testados, e provar que têm como contribuir com esse mundo”, reflete.
“Os indígenas são muito talentosos, mas precisam de incentivos. Além disso, essa produção cultural precisa circular para que essa sub-representação de minorias não aconteça mais. Os indígenas não são só o que se vê sobre eles na mídia”, conclui.

Ed.132 - Agosto e Setembro de 2016

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