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Resenha

Publicado: Quinta, 23 de Abril de 2020, 19h46 | Última atualização em Segunda, 27 de Abril de 2020, 21h35 | Acessos: 2473

O sonho de consertar o mundo via a luta antirracista

Por Jane Felipe Beltrão Foto Reprodução

Antropóloga, professora titular da Universidade Federal do Pará.

Em um país racista como o Brasil, ter uma mulher preta que pensa em “consertar o mundo” não é pouca coisa, especialmente porque sua voz de atriz de grandes predicados e mestre de muitas gerações se junta a outras tantas vozes que buscam um mundo melhor.

Escrever a resenha sobre o livro Caminhos trilhados na luta antirracista é dever de ofício que executo com muita honra, pois ter o registro escrito das narrativas de uma negra militante, que sabe desvendar para o público as raízes do racismo, é um privilégio. Zélia Amador de Deus é mestra da oralidade e da possibilidade de prender imensas plateias pela sua verve convincente de alguém que aprendeu com Francisca Amador de Deus, sua querida avó, que todos os dias lhe dizia: “ninguém é melhor do que tu. Ninguém!

Boa discípula, Zélia se dedicou à tarefa de apresentar aos seus ouvintes e aos leitores as ferramentas que podem “consertar o mundo” e, mesmo nascida e criada na Amazônia, ela entra na roda viva e percorre o mundo na luta antirracista. Hoje ela está aqui, em nossas mãos, com seu texto lúcido, que ela denomina de autobiografia etnográfica, e nos apresenta argumentos firmes em defesa dos direitos de mulheres negras. Aliás, não apenas das mulheres negras, embora este seja o objetivo. As narrativas podem ser tomadas de empréstimo pelos coletivos étnica e racialmente diferenciados, sobretudo pelo incansável combate contra as situações de violência que se apresentam cotidianamente.

Amador de Deus desfia diante de nós uma série de narrativas muito consistentes sobre temas que atravessam o nosso dia a dia. Ela inicia suas considerações mostrando como as negras e os negros no Pará se organizam. Na sequência, traz a lume a questão da discriminação racial. Prossegue, e, a partir da diáspora africana, repensa os corpos negros e os espaços africanizados.

A autora se debruça sobre as ações concretas, considerando a luta pelo estabelecimento de amparo legal para implementação de práticas escolares que “corrijam” as distorções referentes às histórias dos africanos transplantados para o Novo Mundo, sem descurar de apresentar as máscaras de que o racismo lança mão para manter as hierarquias que continuam vigentes. Para comprovar as dificuldades, Amador de Deus faz emergir o movimento negro brasileiro e as nuances das lutas empreendidas, cujos louros mais conhecidos são as políticas afirmativas que tanta polêmica causaram e ainda deixam as elites desconfortáveis.

A vigorosa autora do livro é professora emérita da Universidade Federal do Pará, com formação acadêmica em Letras e Antropologia, atuando no Instituto de Ciência das Artes, no Campus Belém.

A prática acadêmica e a militância fizeram de Zélia Amador de Deus uma referência quando o debate é sobre racismo, e uma parceira de grande capacidade argumentativa quando se trata de denunciar e combater atitudes racistas. Onde há discriminação, lá está nossa autora, em Belém ou em Durban, em aulas magnas aqui e alhures, em movimentos locais, regionais, nacionais e internacionais.

Pelo exposto, emocionada e honrada, como diz Nilma Lino Gomes na apresentação do trabalho, convoco as pessoas que desejam conhecer, aprofundar o debate sobre o antirracismo a ler Amador de Deus, pessoa pela qual nutro respeito, tenho enorme admiração pela qualidade de seu trabalho.

Digo, para finalizar: mesmo que você tenha visto, ouvido ou lido outras narrativas de Zélia Amador de Deus, o trabalho aqui apresentado é uma aula de grande magnitude sobre o que devemos fazer para corrigir o racismo que nos torna desumanos e cruéis. E reafirmo para os que não tiveram o prazer de tê-la visto, ouvido ou lido: é hora de fazê-lo de forma urgente!

O mundo precisa de cada um de nós para humanizá-lo e produzir novos caminhos, os quais, segundo nossos mais doces desejos e a nossa utopia livre do racismo, serão plurais, diversos e respeitosos. Portanto a ordem é À leitura!

Jane Felipe Beltrão: Antropóloga, professora titular da Universidade Federal do Pará.

Serviço: Amador de Deus, Zélia. 2020. Caminhos trilhados na luta antirracista. Belo Horizonte: Autêntica. (Coleção Cultura Negra e Identidades) A ser lançado após a pandemia.

Ed.154 - Abril e Maio de 2020

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