Um destino adequado para os resíduos da construção civil
País recicla apenas 20% dos 84 milhões de m³ de resíduo gerado ao ano
Por Flávia Rocha Foto Acervo da Pesquisa
A indústria de construção civil é essencial para a economia e para o desenvolvimento social do país. No entanto faz-se necessária uma discussão do seu impacto sobre o meio ambiente. Essa indústria é responsável por um excesso de consumo de recursos naturais oriundos de fontes não renováveis e também pela produção de um volume elevado de resíduos sólidos. Segundo a Associação Brasileira para Reciclagem de Resíduos da Construção Civil e Demolição (Abrecon), estima-se que o país gere 84 milhões de metros cúbicos de Resíduos de Construção Civil (RCC) por ano, e apenas 20% são reciclados.
A Abrecon afirma que reciclar, reduzir e reutilizar o entulho, independente do uso que a ele for dado, representa vantagens econômicas, sociais e ambientais, tais como: economia na aquisição de matéria-prima, devido à substituição de materiais convencionais por entulho; diminuição da poluição gerada pelo entulho e de suas consequências negativas, como enchentes e assoreamento de rios e córregos, e preservação das reservas naturais de matéria-prima.
Uma legislação específica para a gestão de RCCs entrou em vigor em 2003, contudo faltam recursos para atividades que visem à divulgação, ao cumprimento e à fiscalização pelos órgãos responsáveis. Atualmente, apenas alguns municípios desenvolvem ações para esse fim.
A pesquisa Diagnóstico da reutilização e reciclagem dos resíduos sólidos de construção civil pelas cooperativas de reciclagem no município de Belém-PA teve como objetivo analisar o cenário de reutilização e reciclagem dos Resíduos de Construção e Demolição (RCD) pelas cooperativas de reciclagem no município de Belém/PA. “Também buscamos medir o nível de interesse das cooperativas de reciclagem do município de Belém em relação a materiais oriundos da construção civil, os RCCs”, afirma autora Ana Victória da Costa Almeida. A dissertação foi defendida pelo Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil (PPGEC/ITEC), com orientação do professor Luiz Mauricio Furtado Maués.
Legislação encontra obstáculos para ser cumprida
Ana Vitória Almeida explica que a metodologia consistiu, primeiramente, na revisão sistemática da literatura existente sobre o assunto. Em sequência, foram elaborados os questionários que dariam norte à pesquisa. Eles foram aplicados em uma cooperativa, validados pelo orientador e, em seguida, aplicados entre as outras cooperativas que fizeram parte do estudo. De posse das análises, foram elaboradas propostas de solução e sugestões para outros estudos com o mesmo tema.
De acordo com a pesquisa, são considerados resíduos da construção civil (RCCs) agregados, concreto, tijolos, pedras, gesso, vidro, madeira, ferro e materiais metálicos não ferrosos, plástico, asfalto quebrado, papel, amianto, solo escavado, pedregulhos, entre outros materiais. Todo esse material é oriundo de construções, reformas, reparos e demolições, além de preparação e escavação de terrenos. “A gestão adequada dos resíduos passa pela educação ambiental que orienta a aplicabilidade dos conceitos dos ‘5Rs’, atualmente ampliado para ‘7Rs’: Repensar, Reduzir, Reutilizar, Reciclar, Recusar, Reparar e Reintegrar”, alerta a pesquisadora.
O estudo sugere que a gestão desses resíduos seja feita com a logística reversa. “Primeiramente, deve haver uma triagem. Com os resíduos devidamente separados, eles devem ser depositados em caçambas e transportados para onde tenham a destinação correta: resíduos que poderão ser reciclados e gerar novas matérias-primas; resíduos que serão reutilizados e, finalmente, os que não poderão voltar ao ciclo produtivo e deverão ser descartados de forma ambientalmente responsável”, explica Ana Vitória Almeida.
A pesquisa destaca que as principais barreiras encontradas para uma logística reversa eficaz são barreiras econômicas, sociais, ambientais e tecnológicas, como: falta de empresas especializadas, de apoio governamental, de treinamento e, ainda, o custo elevado para sua implantação.
Parceria com cooperativas promoveria inclusão social
Uma alternativa para a destinação adequada de resíduos são as cooperativas de catadores. “Essa atividade é importante para abrandar o impacto ambiental dos resíduos sólidos urbanos. Além disso, a organização em forma de cooperativas possibilita a valorização e profissionalização dessa atividade, a inclusão social e a retirada dessas pessoas dos lixões e aterros. Elas pessoas são vítimas da desigualdade social e, por diversos motivos, têm dificuldade para encontrar outro meio de sobrevivência”, afirma Ana Vitória Almeida.
Durante a coleta de dados, foram entrevistadas quatro cooperativas: a Associação dos Catadores de Coleta Seletiva de Belém (ACCBS) e a Associação Recicladores de Águas Lindas (ARAL), que dividem o mesmo espaço de trabalho; a Cooperativa dos Catadores de Materiais Recicláveis (Concaves) e a Cooperativa Filhos do Sol.
As quatro cooperativas, juntas, processam 354,5 toneladas de material por mês e auxiliam cerca de 110 famílias. De acordo com os dados coletados, todas as cooperativas têm interesse em realizar o processamento de RCCs e afirmam que não haveria dificuldade em incluir os procedimentos necessários para isso. Contudo, atualmente, o processamento de RCC é mínimo. “Os representantes de todas as cooperativas afirmaram que a falta de comunicação ou canal comunicativo com empresas da construção civil é um empecilho”, revela a pesquisadora.
Os cooperados demonstraram grande interesse em fazer uso de entulho de RCC para aterramentos de moradias de seus colaboradores. Se existisse um canal entre a comunidade e as empresas de construção civil, essa coleta seria mais eficiente e causaria um impacto positivo na vida de muitas famílias. Uma das propostas sugeridas para facilitar o trabalho das cooperativas em Belém é a criação de um canal de comunicação, como um aplicativo ou site, que ligue os geradores de resíduos aos cooperados. Assim, os RCC que são de interesse das cooperativas poderiam ser coletados no local e dia solicitados. “Para que ocorra o encorajamento dessas práticas, deve existir interesse das esferas públicas, políticas e sociais em ampliar práticas de sustentabilidade dentro dos municípios paraenses”, conclui.
Beira do Rio edição 160
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