Portas abertas para um novo mundo
Reabilitação verbal é essencial para pacientes com implante coclear
Por Nicole França Foto Alexandre de Moraes
Com o avanço da tecnologia e o desenvolvimento das pesquisas, o implante coclear (IC) para pessoas com surdez profunda está se tornando cada vez mais acessível. No entanto, apesar de ser uma tecnologia inovadora, o implante não garante a restauração completa da audição. Além disso, o fato de uma pessoa que realizou o implante estar escutando um som não significa que ela o compreende e sabe como atuar diante dele. Dessa forma, é necessária uma reabilitação específica para que os indivíduos que usufruem do IC possam se adequar a esse novo mundo ao qual estão sendo apresentados: o mundo do som.
Pensando nisso, a pesquisadora Fabiane da Silva Pereira elaborou a tese Contribuições da análise do comportamento para reabilitação verbal de crianças usuárias de implante coclear, apresentada no Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento (PPGTPC/NTPC/UFPA) e teve como orientador o professor Grauben José Alves de Assis. Em sua tese, Fabiane Pereira avaliou o desempenho de crianças com implante coclear como ouvintes e falantes.
Durante a pesquisa, Fabiane verificou as dificuldades que se sucedem ao implante coclear e a necessidade de um programa de reabilitação verbal nos hospitais que oferecem o IC, uma vez que, sem a reabilitação, a criança perceberá os sons, mas não saberá interpretá-los. “Desde o mestrado, eu venho estudando como o som vai ganhar um sentido para essas crianças. O nosso objetivo é criar um programa de reabilitação verbal para que os usuários de implante coclear possam usufruir o máximo possível do aparelho”, afirmou a psicóloga.
A pesquisa é experimental e tem como objetivo analisar o comportamento linguístico de crianças com surdez profunda que utilizam o implante coclear. Para isso, foram verificados os efeitos do procedimento de Instrução com Múltiplos Exemplares (MEI) e os repertórios de naming. Também foi utilizada a metodologia de linha de base múltipla, na qual é realizada uma análise do antes e do depois da aplicação do procedimento.
Metodologia apresentou 100% de aproveitamento
O procedimento de Instrução com Múltiplos Exemplares (MEI) é uma estratégia de ensino que tem como objetivo facilitar a aprendizagem e instruir o indivíduo. Nele, são apresentados para o paciente um número grande de estímulos ou um número grande de tarefas com apenas um estímulo. No caso da pesquisa, foi realizado um estudo múltiplo de tarefas, no qual a criança usuária de implante coclear foi apresentada a um único estímulo. “Eu, primeiro, mostrava, por exemplo, a figura de uma bola e a criança devia agir como ouvinte e como falante, ou seja, ela tinha que apontar para a bola quando eu perguntasse onde está a bola, repetir ‘bola’ se eu pedisse, ela tinha que selecionar, entre várias figuras, a figura correspondente à bola. Então, nesse processo, a criança tinha várias tarefas para serem realizadas”, esclareceu Fabiane.
Segundo a pesquisadora, os estudos feitos indicam que o procedimento MEI é eficiente para o ensino e tem produzido bons resultados. “No início do estudo, as crianças tinham um desempenho muito abaixo do esperado, elas não conseguiam dar nome para as coisas. Com o procedimento e mantendo a motivação da criança, no final do estudo, já era possível observar um desempenho de 100% de acerto, ou seja, de 10 tentativas, ela acertava as 10. Na nossa avaliação, com esse desempenho, nós alcançamos o nosso objetivo. Tivemos sucesso em todas as crianças”, explica Fabiane.
O naming é um fenômeno da aprendizagem que descreve o desenvolvimento da linguagem de crianças muito pequenas. Dessa forma, o naming também se configura como a habilidade das crianças de agir como ouvintes e falantes diante das relações e estímulos do mundo. Em vista disso, o naming é um estágio que, quando alcançado, a criança poderá aprender a ler e a desenvolver alguns aspectos mais complexos da linguagem.
Fabiane Pereira ressalta que, durante os procedimentos, é muito importante o uso de um reforço, algo que motive a criança a participar, “eu precisei usar motivadores eficazes. Fiz um levantamento inicial para saber o que despertava a atenção de cada criança para que ela se engajasse na tarefa e voltasse no outro dia, até concluirmos”. De acordo com Fabiane, o fator de engajamento variava de adesivos a salgadinhos.
Processo exige persistência dos envolvidos
De acordo com a pesquisa, o desenvolvimento verbal das crianças com implante coclear é indispensável. Elas devem ser inseridas em programas com fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, psicólogos, além de contar com ferramentas que contribuam para que a reabilitação aconteça. Entre essas ferramentas, está a música. Fabiane Pereira também declara que, quanto mais cedo a criança receber o implante coclear, melhor será o seu desempenho como ouvinte e falante.
A reabilitação verbal foi fundamental para a inserção de Marcus Vinícius Ferreira no mundo dos sons. Marcus nasceu surdo e realizou o implante coclear em 2010, quando tinha dois anos e oito meses. Ele já fazia reabilitação antes mesmo do implante, pois usava um aparelho de amplificação sonora. Após o implante, a reabilitação tornou-se mais eficaz. “No primeiro momento após o implante, ele ficou só captando as informações, mas não falava nada. Com a fonoaudióloga duas vezes por semana e em casa, nós fomos ensinando. Comprei material e brinquedos educativos para estimular. Foi um trabalho repetitivo e muito difícil. A fala não foi um milagre, foi um trabalho de formiguinha”, lembra Fabiana Ferreira, mãe de Marcus.
Para Fabiana, com a reabilitação, tudo foi ensinado e aprendido no tempo certo. Hoje, Marcus tem uma boa conversação, consegue cantar e leva uma vida normal. “Ele interage com todo mundo. Sempre que tem uma oportunidade, ele puxa assunto. Viajando, então, a pessoa conta a vida dela todinha para ele. Acredito que, sem o implante, a interação no dia a dia seria muito mais difícil e a vida seria mais complicada. Com o implante, é vida normal!”, afirma.
O que é o Implante Coclear?
O implante coclear é um dispositivo eletrônico que tem o objetivo de substituir as funções das células do ouvido interno de pessoas com surdez profunda. É um equipamento implantado cirurgicamente na orelha, o qual tem a função de estimular o nervo auditivo e recriar as sensações sonoras.
Fonte: https://www.direitodeouvir.com.br/blog/implante-coclear
Hospital Bettina Ferro oferece a cirurgia
Desde 2010, o hospital já realizou mais de cem procedimentos, sendo o único hospital da Região Norte do Brasil a oferecer a cirurgia. O HUBFS efetua uma seleção de pacientes para a realização da cirurgia, os quais devem atender a vários critérios nas áreas de Otorrinolaringologia, Fonoaudiologia, Psicologia e Serviço Social. O procedimento é integralmente ligado ao Sistema Único de Saúde (SUS).Dessa forma, os candidatos devem ser referenciados por uma unidade de saúde do Pará ou de outro Estado brasileiro.
Serviço: O Hospital Bettina Ferro fica no Campus Universitário Guamá, com acesso pela Avenida Perimetral, portão IV da UFPA, Terra Firme, Belém (PA). Mais informações: (91) 3201-7819.
Fonte: http://www.bettina.ufpa.br/
Ed.142 - Abril e Maio de 2018
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Tese Contribuições da análise do comportamento para reabilitação verbal de crianças usuárias de implante coclear
Autora: Fabiane da Silva Pereira
Orientador: Grauben José Alves de Assis
Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento (PPGTPC/NTPC/UFPA)
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