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Opinião: Exploração petrolífera na margem equatorial

Publicado: Segunda, 08 de Janeiro de 2024, 18h50 | Última atualização em Segunda, 19 de Fevereiro de 2024, 20h05 | Acessos: 285

Progresso econômico ou risco ambiental para a Amazônia?

André Cutrim Carvalho Foto: acervo pessoal

Um dos desafios centrais nas últimas Conferências das Partes (COP), incluindo a COP 26, Escócia/2021, a COP 27, Egito/2022, e, mais recentemente, a COP 28, nos Emirados Árabes Unidos,  tem sido a dificuldade em reduzir a dependência global de combustíveis fósseis. Estes, caracterizados como recursos naturais não renováveis, representam uma problemática central para a sustentabilidade ambiental e o equilíbrio econômico-ecológico global.

Esta questão torna-se uma barreira persistente no progresso das discussões climáticas internacionais, já que os combustíveis fósseis, em particular o petróleo, têm contribuído consideravelmente para as emissões globais de gases de efeito estufa e para as mudanças climáticas.

Apesar de muitos países terem assumido o compromisso de reduzir suas emissões de gases de efeito estufa, frequentemente observa-se uma discrepância considerável entre esses compromissos e a concretização prática dessas medidas. São questões que, de imediato, reverberam na forma de planos inadequados de governança para reduzir a dependência de combustíveis fósseis e na falta de investimento em fontes de energia renováveis, principalmente nos países que buscam um desenvolvimento socio-sustentável.

O desafio atual, especialmente para o Brasil, reside na continuidade do financiamento e subsídio dos combustíveis fósseis por governos e instituições financeiras. Esse cenário se confronta com a necessidade de redirecionar recursos para o desenvolvimento de tecnologias limpas e renováveis.

A continuação desse suporte às fontes energéticas tradicionais e poluentes contrasta com os esforços globais de mitigação das mudanças climáticas e a preservação de ecossistemas vitais, como a da Amazônia brasileira, especialmente a parte localizada em território paraense. 

Além disso, embora os países com maiores emissões de gases de efeito estufa tenham grande e distinta responsabilidade neste contexto, é fundamental reconhecer que uma solução eficaz exige esforços coordenados em escala global. Desta forma, é essencial que as nações envolvidas neste processo trabalhem juntas com países em desenvolvimento para superar essas barreiras e avançar na direção de um futuro sustentável.

Por isso, enfrentar as pendências nas ações setoriais voltadas à redução das emissões de gases de efeito estufa requer uma estratégia detalhada e a adoção de um planejamento estratégico para esse problema ser superado de maneira eficaz. Para isso, porém, é crucial conduzir uma análise que transcenda os aspectos técnicos e “abrace” a urgência inadiável destas questões ambientais, integrando uma compreensão profunda dos impactos e das soluções necessárias para combater as emissões de gases de efeito estufa de forma tempestiva.

Dado o panorama contemporâneo, marcado por dificuldades econômicas e compromissos ambientais, considero oportuno elaborar uma análise sobre a exploração petrolífera na região da Margem Equatorial, com foco especial nas Bacias da Foz do Amazonas e Pará-Maranhão. Essa perspectiva envolve uma série de questões relevantes, sobretudo quando se considera a história recente de grandes projetos de desenvolvimento região amazônica. A exploração petrolífera nessas áreas sublinha a necessidade de equilibrar de maneira criteriosa o progresso econômico, a segurança energética e a preservação ambiental, instigando o Brasil a buscar estrategicamente por cada um.

Manifesto um profundo ceticismo quanto aos benefícios econômicos que supostamente advirão dessa modalidade de exploração. Na verdade, reconheço a potencialidade de benefícios financeiros futuros, os quais poderiam representar uma fonte significativa de recursos para o Brasil, sobretudo para a Amazônia e, consequentemente, ao Pará. Contudo, levanto uma questão crucial: quais serão os custos sociais, econômicos e ambientais que estaremos dispostos a suportar ao adotar este modelo de desenvolvimento? Essa reflexão é fundamental para avaliar as consequências e os impactos a longo prazo das nossas decisões em um contexto de um país que pretende adotar um modelo de desenvolvimento em prol da sustentabilidade. 

Com base na minha expertise, como economista e engenheiro, o principal entrave para a prospecção de petróleo, especialmente em regiões como a Margem Equatorial do Brasil, está relacionado aos obstáculos de uma exploração em ambientes de águas profundas e ecossistemas tão sensíveis. Atualmente, a exploração em águas profundas requer o uso de tecnologias de perfuração e exploração de petróleo altamente avançadas, o que exige a utilização de equipamentos projetados para funcionar sob extrema pressão e em grandes profundidades oceânicas, representando um desafio em termos de engenharia e de investimento financeiro. 

Em águas profundas, os riscos geológicos, como deslizamentos de terra submarinos e atividade sísmica, são amplificados. A complexidade geofísica do subsolo marinho da Amazônia brasileira, por exemplo, pode dificultar a identificação precisa de reservatórios de petróleo. Ademais, o transporte de equipamentos e recursos humanos, bem como a manutenção contínua de plataformas de perfuração em locais remotos, impõem adversidades logísticas e financeiras substanciais ao Brasil e a Amazônia, que lidam no seu dia-a-dia com outras prioridades contrastantes. 

Assim, considerando uma série de empecilhos para a realização da exploração de petróleo na Marquem Equatorial, avaliar o impacto econômico no Pará é uma tarefa difícil. Na prática, embora seja tecnicamente viável, projetar o impacto dos royalties na economia paraense apresenta suas próprias especificidades dada a complexa natureza do emprego de determinados fatores. As projeções, por sua vez, devem ser vistas como estimativas que podem ser ajustadas à medida que novas informações se tornem disponíveis e da atualização jurídica. 

Logo, desenvolver uma estimativa numérica rigorosa do impacto econômico dos royalties do petróleo no Pará equivale a uma tarefa de previsão desafiadora. Na ausência de dados detalhados, tal exercício tende a ser predominantemente especulativo. No entanto, é possível propor um método geral para chegar a uma estimativa. 

Os royalties são tradicionalmente calculados como uma porcentagem da receita bruta obtida com a produção de petróleo. Esta porcentagem é definida pela legislação vigente e pelos contratos estabelecidos. Dessa forma, ao aplicar essa porcentagem específica à receita bruta estimada, obteremos a receita total estimada em royalties

Sendo assim, seria necessário estimar a quantidade de petróleo produzida na Margem Equatorial, especificamente na área que pertence ao Estado do Pará, o que envolveria uma análise de dados geológicos, geográficos e de exploração; em seguida, seria aplicado o preço atual do petróleo por barril (em dólares) para estimar a receita bruta potencial dessa produção. 

Ao final desse processo, caberá aos formuladores de políticas governamentais a tarefa primordial de avaliar o efeito multiplicador dos royalties aplicados na economia do Pará. Esse diagnóstico incluiria uma análise de possíveis investimentos dos royalties em áreas vitais, tais como: infraestrutura, saneamento, saúde e educação, e, posteriormente, de como esses investimentos poderiam catalisar um novo modelo de desenvolvimento econômico para a região. 

Desse modo, com base no valor atual do barril de petróleo brent, hoje em US$ 75,71 (na data de 12/12/2023), a estimativa para o Estado do Pará poderia ser calculada nos seguintes termos, em um método que denomino de “EcoPetrolAnálise”, uma avaliação sustentável dos ganhos petrolíferos:

1º Com a produção estimada de 1 bilhão de barris, a receita bruta estimada hoje seria de aproximadamente US$ 75,71 bilhões;

2º Aplicando um percentual de royalties de 10%, o total estimado de royalties seria de aproximadamente US$ 7,57 bilhões;

3º Por fim, considerando que 20% dos royalties seriam destinados ao Estado do Pará, compromissado com um modelo verdadeiramente sustentável, neste exercício de estimativa hipotético, isso resultaria em um montante de aproximadamente US$ 1,51 bilhões, ou seja, R$ 7,78 bilhões. 

Embora esse exemplo forneça uma estrutura adequada para realizar, em termos de estimativa, uma avaliação sustentável dos ganhos petrolíferos, é crucial enfatizar que os valores reais dependeriam de diversos parâmetros e condições econômicas, incluindo a quantidade exata de petróleo produzido pelo país, os preços do mercado, a legislação vigente sobre royalties e a política de distribuição desses recursos para estados e municípios. 

Percebe-se, desta forma, que o Estado do Pará se encontra em uma verdadeira encruzilhada em termos de desenvolvimento. Uma gestão prudente e responsável dos royalties do petróleo poderá ser a chave para desbloquear (ou não) um futuro de prosperidade, mas isso exigirá a adoção de um modelo de governança transparente e com participação ativa da sociedade em todos os níveis. 

Portanto, frente aos desafios, incertezas e possibilidades que se avizinham para a Amazônia, convém lembrar que a maior riqueza de um recurso natural transcende os seus dividendos imediatos, residindo na sabedoria com que será moldado o seu legado para as futuras gerações, especificamente na perspectiva de um desenvolvimento socioeconômico e sustentável. 

Na prática, qualquer atividade de prospecção deverá levar em consideração o seu impacto ambiental, inclusive a proteção da biodiversidade marinha e terrestre. Cabe destacar que a prospecção na Amazônia envolve considerações sociais e culturais, particularmente no que diz respeito aos povos da floresta, que serão diretamente impactados pela exploração de recursos naturais em suas terras. 

Na busca pelo equilíbrio entre o progresso econômico e a preservação ambiental, torna-se imperativo considerarmos não apenas o valor imediato que os recursos naturais nos oferecerão, mas também o legado que será deixado para as gerações futuras. As riquezas da Amazônia, tanto em termos de biodiversidade quanto de potencial econômico, são inegavelmente vastas, mas a verdadeira riqueza reside na coexistência harmoniosa e na relação indissociável do homem para com a natureza. 

Portanto, a superação desses desafios demandará uma série de avanços e inovações tecnológicas, além de investimentos significativos, o que inclui investimentos em fontes de energia renováveis, e, fundamentalmente, uma abordagem minuciosa que possa equilibrar o crescimento econômico com a utilização sustentável dos recursos naturais, resultando em um desenvolvimento social, econômico e genuinamente sustentável.

André Cutrim Carvalho é Engenheiro e Economista com Doutorado em Desenvolvimento Econômico pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Professor-pesquisador da Faculdade de Ciências Econômicas (FACECON) e do Programa de Pós-Graduação em Gestão de Recursos Naturais e Desenvolvimento Local na Amazônia/Núcleo de Meio Ambiente (PPGEDAM/NUMA) da UFPA. E-mail: andrecc83@gmail.com

 Beira do Rio edição 169

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