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Estresse materno pode comprometer desenvolvimento infantil

Publicado: Terça, 26 de Julho de 2016, 19h06 | Última atualização em Sexta, 26 de Agosto de 2016, 15h10 | Acessos: 2499

Pesquisadora observou crianças urbanas e ribeirinhas

 

Por Maria Luisa Moraes Foto Acervo do Pesquisador

A criação dos filhos impõe muitos desafios, principalmente, para as mulheres. Apesar de, gradativamente, os pais estarem se envolvendo mais na educação das crianças, a responsabilidade maior ainda recai sobre a figura materna. As dificuldades enfrentadas nos cuidados com os pequenos podem ser uma fonte de estresse que, se não tratada, pode comprometer o desenvolvimento das crianças e a saúde da própria mãe.

O estresse entre mães e as diferenças na criação de filhos entre os contextos urbanos e ribeirinhos são temas presentes na Dissertação Estresse Materno e Desenvolvimento de Crianças Moradoras em Contexto Ribeirinho e Urbano de Belém, de Lilianne do Socorro Guimarães Freitas, defendida no Programa de Pós-Graduação em Teoria e Pesquisa do Comportamento (PPGTPC/UFPA).

Ainda na Graduação em Fisioterapia, na Universidade Estadual do Pará (UEPA), Lilianne começou a frequentar o espaço ribeirinho. Assim surgiu o interesse em aprofundar seus estudos nesse cenário, relacionando com os temas que gostaria de abordar. Sobre isso, ela relata: “Sabemos que há um grande vínculo entre mãe/criança e a partir do qual essa criança se desenvolve. Então, durante a Iniciação Científica, comecei a me interessar por essa relação entre mães e filhos e, por estar dentro desse lócus ribeirinho, decidi realizar o estudo nos dois ambientes”.

Ela diz, ainda, que há uma carência de pesquisas sobre o impacto do estresse materno em contextos diferentes do urbano e a vontade de chegar a novos resultados também a impulsionou. “90% das pesquisas sobre desenvolvimento infantil, nacionais ou internacionais, são feitas com crianças urbanas. Então quisemos verificar se havia grande diferença e que diferença seria essa”, diz Liliane.

Sabe-se que o contexto em que a criança vive repercute diretamente em seu desenvolvimento, tanto na forma quanto na organização. A probabilidade de o estresse materno ter impacto negativo sobre o desenvolvimento infantil é maior em ambientes desfavoráveis. As principais diferenças observadas estão na grande diversidade de enquadramentos sociais, econômicos e educacionais e na densidade populacional.

No contexto ribeirinho, as mães são mais jovens e têm mais filhos

Lilianne Freitas explica que, apesar de encontrar situações de pobreza em ambos os contextos, existem diferenças causadas pelo próprio ambiente. “Quando olhamos para a idade materna, na pesquisa, observamos que as mães ribeirinhas são muito mais jovens. Enquanto as mães ribeirinhas têm de 18 a 24 anos, as mães urbanas têm de 30 a 35”, exemplifica.

Outra diferença analisada foi o número de filhos. A média ribeirinha é de três ou mais filhos, com famílias de até seis crianças. Já a média urbana é de um, no máximo, dois filhos. A escolaridade dessas mães também se colocou como fator-chave. A pesquisadora conta que, nas comunidades ribeirinhas, a população tem acesso restrito aos ciclos iniciais do ensino fundamental. “Se a família quiser dar continuidade aos estudos da criança, tem que vir para Belém”, afirma a pesquisadora. Estatisticamente, cerca de 70% a 80% das mães ribeirinhas estudaram menos de cinco anos, enquanto as mães urbanas estiveram, pelo menos, onze anos em sala de aula.

Para chegar aos dados da pesquisa, Lilianne recorreu aos registros do Programa Saúde da Família. “Eles têm todo o cadastro das famílias, dividido em categorias, como a idade e o número de crianças por família. Foi a partir desse cadastro que eu fui atrás das famílias”, explica.

O principal critério de inclusão na pesquisa foi a faixa etária das crianças, em função do instrumento utilizado para avaliação do desenvolvimento. “Procurei no cadastro da Unidade de Saúde todas as crianças que tinham entre um mês e 3,5 anos e visitei, junto com os agentes comunitários de saúde, cada família, para convidá-los a participar da pesquisa”, conta Lilianne Freitas.

Com as crianças urbanas, o processo foi semelhante. O Centro de Saúde-Escola da UEPA abriga o Programa “Maternar”, que consiste em um serviço responsável pelos cuidados de saúde materno-infantil. A pesquisadora filtrou os registros das crianças que atendiam à faixa etária.

Ambientes provocam diferentes tipos de atraso no desenvolvimento

As rotinas das crianças ribeirinhas e urbanas são completamente distintas, e isso, segundo Lilianne Freitas , decorre do ambiente. “Por exemplo, a maré é uma coisa que determina as brincadeiras das crianças ribeirinhas. Quando a maré está baixa, eles conseguem brincar no terreno, mas na maré alta, eles perdem esse espaço”, exemplifica.

Com relação ao desenvolvimento, “o atraso no contexto ribeirinho está relacionado à linguagem e à cognição. Já no contexto urbano, o atraso foi relacionado à linguagem e ao desenvolvimento motor”, revela a pesquisadora.

Ela atribui esse fato às novas tecnologias, que não exigem deslocamento ou habilidades motoras. “Hoje, é difícil, para as crianças urbanas, brincar na rua. Isso acaba afetando o desenvolvimento delas. Enquanto a criança ribeirinha, a partir de um ano e meio, já está nadando, correndo e subindo em árvore. Dessa forma, o desenvolvimento motor dessa criança é favorecido”, avalia.

Em contrapartida, o desenvolvimento cognitivo é mais atrasado. Segundo a pesquisadora, isso pode estar relacionado à escolaridade materna, já que a mãe é quem mais estimula a criança. Quanto maior a escolaridade dessa mãe, maior é a variedade de estímulos que o filho recebe.

Apesar de quase sempre o estresse estar atribuído a algo negativo, ele pode também ser algo construtivo, se dosado no nível certo. Lilianne Freitas esclarece que o estresse é um mecanismo fisiológico de defesa, que prepara o ser humano para lutar ou fugir em situações de perigo. O problema é quando esses estímulos começam a ocorrer em maior intensidade e de forma mais recorrente, como acontece com as mães estudadas na pesquisa.

Nessa situação, os sintomas podem ser psicológicos e físicos. O estresse alto pode causar acidez estomacal, enxaquecas, ansiedade e até mesmo depressão. E isso terá impacto no desenvolvimento infantil. “Quando a mãe está com nível de estresse elevado e recorrente, ela pode não ser competente o bastante para interagir com esse filho, agindo de forma negligente ou até mesmo maltratando fisicamente a criança”, analisa Lilianne.

O objetivo da pesquisa é expandir o debate sobre o desenvolvimento infantil. “É essencial que crianças com atrasos na primeira infância sejam encaminhadas para tratamento precocemente, assim como as mães. O importante dessa pesquisa seria fomentar políticas públicas que pudessem fazer uma intervenção para a mãe e para o filho, ao mesmo tempo”, sugere.

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