Tecnologia para fabricação do tucupi
Processo garante segurança ao “carro-chefe” da culinária paraense
Por Nicole França Foto Alexandre de Moraes
Quando o mês de outubro vai chegando, os preparativos para o Círio de Nazaré começam e trazem consigo as comidas tradicionais da época, como a maniçoba e o pato no tucupi. O tucupi, com sua característica cor amarela, é um dos ingredientes mais populares e tradicionais da culinária paraense. O sumo amarelo é extraído da raiz da mandioca brava e passa por vários processos, até chegar ao estado adequado para consumo. Tendo em vista essa tradição, a engenheira de alimentos Ana Paula Rocha Campos elaborou a dissertação Estudo do processo de conservação do tucupi, apresentada no Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos (PPGCTA/ITEC), com orientação da professora Ana Vânia Carvalho.
A dissertação apresentou um processo tecnológico adequado para a obtenção do tucupi, uma vez que a raiz da mandioca utilizada para a sua fabricação pode causar intoxicação em razão dos altos teores de ácido cianídrico. Entre os problemas de saúde que podem ser causados, estão a neuropatia atáxica tropical, caracterizada por uma desordem neurológica; o konzo, paralisia permanente; e o hipertireoidismo, quando a glândula tireoide produz hormônios em excesso.
Para a pesquisa, Ana Paula Campos realizou a coleta de várias amostras de tucupi, tanto de feiras quanto de supermercados de Belém. “Visitei vários fabricantes e analisei o tipo de mandioca, o tempo de fermentação e o tempo de cocção que eles utilizavam. Também observei as condições sanitárias do ambiente, para determinar o que realmente poderia influenciar na qualidade do produto. Foram feitas as análises físico-químicas e microbiológicas, para verificar se os produtos estavam de acordo com o padrão de identidade e qualidade do tucupi estipulado pela Agência de Defesa Agropecuária do Pará (ADEPARÁ). A maioria, infelizmente, estava em desacordo, por isso o estudo buscou padronizar o processo de produção do tucupi”, afirmou.
De acordo com a engenheira, o ácido cianídrico deve ser eliminado durante o processo de fabricação. “Quando começa a ralação da raiz de mandioca, ocorre a dilaceração do tecido vegetal e o início do processo de cianogênese, resultando no aumento da concentração de ácidos cianídricos. O processo de destoxificação do produto ocorre, principalmente, nas etapas de fermentação e cocção pelo fato de o ácido cianídrico ser volátil. Dessa forma ele será eliminado no ar, durante o aquecimento. Assim, o tempo de cocção é considerado o principal parâmetro para que se possa eliminar o teor de ácido cianídrico do tucupi”, explica Ana Paula Campos.
Amostras coletadas em feiras apresentam contaminação
De acordo com a pesquisa, as amostras de tucupi contaminadas foram, principalmente, as coletadas nas feiras. “Não há um padrão de qualidade higiênica e sanitária. Muitas vezes, o tucupi é feito no próprio local. As amostras apresentaram elevadas quantidades de micro-organismos (bactérias), além de alta concentração de ácido cianídrico em razão da cocção e do processo de fabricação inadequados”, afirmou Ana Paula Campos.
Com base nos problemas constatados, a engenheira elaborou um planejamento experimental, utilizando-o no processo de fabricação do tucupi em laboratório. Ana Paula também analisou vários tempos de cocção e fermentação. O processo de cocção consiste na aplicação de calor, dando cor, sabor e odor aos alimentos. Este processo é um fator determinante para garantir níveis seguros de ácido cianídrico no tucupi. “Além da cocção, a fermentação também vai influenciar na qualidade e nas características sensoriais do produto. Busquei garantir um produto seguro e sensorialmente aceitável. A fermentação influencia a acidez do tucupi, enquanto a cocção garante a segurança microbiológica e os baixos níveis de ácido cianídrico”, esclarece a autora da pesquisa.
Com os experimentos, constatou-se que o tempo ideal de fermentação é de 24 horas e o de cocção é de 40 minutos. Esse processo garante produtos de boa qualidade em relação ao teor de ácido cianídrico e à segurança microbiológica e agradável ao paladar. Com o tucupi produzido em laboratório, também foi possível avaliar o tempo de prateleira mais adequado. Os produtos comercializados indicam validade de 30 dias em ambiente refrigerado. Já o tucupi produzido na pesquisa pode durar até 49 dias, mantendo todas as suas características.
Ed.145 - Outubro e Novembro de 2018
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Estudo do processo de conservação do tucupi
Autora: Ana Paula Rocha Campos
Orientadora: Ana Vânia Carvalho
Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos (PPGCTA/ITEC)
Comentários
Venho de uma família que trabalha com tucupi a mais de 50 anos foi passado de gerações e fico feliz em saber que meus tios fazem o processo correto...